Saúde mental na Adolescência– Parte 3/3: ESCOLA E FAMÍLIA COMO AMBIENTES DE CUIDADO E TRANSFORMAÇÃO
- Paulo Garcia

- 21 de jul.
- 4 min de leitura

A saúde mental na adolescência emerge como um tema de crescente urgência e complexidade, demandando uma análise aprofundada dos contextos nos quais os jovens se desenvolvem. Mais do que meros espaços físicos, Escola e Família são ambientes emocionais que moldam a percepção de si, as relações interpessoais e a capacidade de lidar com os desafios inerentes a essa fase de transição. A reflexão aqui proposta visa não apenas reiterar a importância desses núcleos, mas também aprofundar a compreensão sobre as dinâmicas que podem tanto proteger quanto fragilizar a saúde mental dos adolescentes, incorporando dados e perspectivas complementares.
Família e a escola são os dois ambientes primordiais na vida do adolescente. A família, idealmente, deveria ser o primeiro e mais seguro porto de acolhimento emocional. No entanto, a realidade muitas vezes se distancia dessa expectativa. A falta de tempo, a dificuldade em estabelecer um diálogo aberto e a perpetuação de padrões autoritários (ou, pelo contrário, a liberdade total aos adolescentes) podem criar um ambiente onde os sinais de sofrimento emocional são ignorados ou mal interpretados. A invalidação dos sentimentos dos adolescentes, rotulados como “rebeldia” ou “preguiça”, leva ao silenciamento de suas dores, impedindo que busquem ou recebam o apoio necessário.
Em contrapartida, a escola, embora tradicionalmente focada no ensino de conteúdos acadêmicos, tem assumido, por vezes, o papel de único espaço de escuta para muitos adolescentes. Isso acontece, porque quantas vezes entramos numa sala de aula e vemos crianças e adolescentes enfrentando algumas situações que muitos adultos não saberiam como lidar. Educadores e até colegas tornam-se figuras de referência, oferecendo um acolhimento que não encontram em casa. Essa inversão de papéis, contudo, impõe um fardo pesado sobre os educadores. A maioria não possui formação específica em saúde mental, e a crescente demanda por suporte emocional pode levar à sobrecarga e ao adoecimento desses profissionais.
É fundamental compreender que o sofrimento emocional na adolescência nem sempre se manifesta de forma explícita. Ansiedade, depressão e outros transtornos podem se apresentar como indisciplina, irritabilidade, desinteresse, dificuldade de concentração ou agressividade. A escola, nesse sentido, precisa transcender a visão do comportamento como um mero problema a ser corrigido e passar a interpretá-lo como uma linguagem, um pedido de ajuda codificado. Essa mudança de perspectiva é crucial para que os adultos, tanto na família quanto na escola, possam identificar e responder adequadamente às necessidades dos adolescentes.
Diante do cenário complexo e dos desafios apresentados, torna-se imperativo o desenvolvimento de estratégias integradas e colaborativas entre família e escola para promover a saúde mental dos adolescentes. Há caminhos práticos que, se implementados de forma consistente, podem transformar esses ambientes em verdadeiros espaços de proteção e desenvolvimento, como seguem:
1. Qualificação de Professores e Famílias para o Cuidado Emocional
A capacitação é o ponto de partida. É essencial oferecer formação continuada para educadores, abordando temas como saúde mental, identificação de sinais de sofrimento, e técnicas de escuta qualificada. Para as famílias, a promoção de rodas de conversa e palestras pode desmistificar o sofrimento psíquico na adolescência, auxiliando pais e responsáveis a reconhecerem e validarem os sentimentos de seus filhos. Incentivar a comunicação não violenta e o fortalecimento de vínculos afetivos são práticas que devem ser disseminadas em ambos os ambientes.
2. Fortalecimento de Redes de Apoio na Escola
A escola, como espaço de convivência diária, tem o potencial de se tornar um polo de apoio psicossocial. A criação de espaços permanentes de acolhimento, como salas de escuta, grupos de apoio, pode oferecer aos adolescentes um local seguro para expressar suas angústias. A presença de psicólogos e equipes multidisciplinares nas escolas, com atuação contínua e integrada ao cotidiano escolar, é fundamental (embora ainda sonho, pois, como exemplo, quantas redes de ensino não possui um psicólogo sequer?!). Além disso, a incorporação de habilidades socioemocionais no currículo, de forma transversal, contribui para o desenvolvimento do autoconhecimento, empatia, cooperação e autorregulação dos alunos.
3. Diálogo Constante entre Escola e Família
A comunicação efetiva entre escola e família é a chave para uma abordagem integral da situação. Estimular canais de comunicação abertos e respeitosos, onde educadores e responsáveis possam compartilhar observações e sinais de alerta com sensibilidade, é crucial. A construção conjunta de caminhos a serem percorridos, sem culpabilizações, garante que o adolescente receba um suporte consistente e integrado em todos os seus ambientes de convívio.
4. Escuta e Protagonismo Juvenil
É fundamental que os adolescentes sejam protagonistas em seu próprio processo de cuidado. Criar espaços de fala, permite que eles nomeiem suas dores, expressem seus desejos e participem ativamente da construção de soluções. Fortalecer sua autoestima e senso de pertencimento, valorizando sua singularidade e potência, é um passo essencial para o desenvolvimento de sua resiliência.
5. Cuidado com o Adulto que Cuida
Por fim, mas não menos importante, é imperativo cuidar de quem cuida. Educadores, pais e responsáveis que estão emocionalmente esgotados não conseguem oferecer o suporte adequado aos adolescentes. Investir no bem-estar dos adultos, oferecendo apoio psicológico e condições de trabalho adequadas, é um investimento direto na saúde mental dos jovens. A sobrecarga e o abandono institucional dos educadores são questões que precisam ser atacadas com urgência para que possam desempenhar seu papel de forma plena.
A saúde mental na adolescência é um reflexo direto da qualidade dos ambientes familiar e escolar. A abordagem a essa temática exige uma mudança de paradigma: de uma visão reativa, focada na correção de sintomas, para uma postura proativa, que busca compreender as causas e transformar os ambientes que geram sofrimento.
É fundamental que a sociedade reconheça a urgência de investir na formação e no suporte de pais e educadores, na criação de redes de apoio robustas nas escolas e no fortalecimento do diálogo entre esses dois pilares. A escuta ativa, a empatia e o reconhecimento do adolescente como protagonista de sua própria jornada são elementos-chave para a construção de um futuro mais saudável. A adolescência não é o problema. A transformação necessária passa pela construção de vínculos e pela criação de ambientes onde o adolescente se sinta autorizado a existir plenamente, com suas dores, dúvidas e potencialidades.
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